"Uma vida que não é examinada não merece ser vivida!"
Sócrates

quarta-feira, 7 de julho de 2010

O que fazer depois de oferecer a outra face?

Nota do Autor

O presente trabalho não tem pretensões filosófico-bíblico-teológicas, mas simplesmente de falar com arte e um pouco de bom humor (porque Deus é AhuMOR) de uma realidade fatídica que assola cristãos de diferentes confissões e que será percebida ao passo que se lê a estória e se considera o epílogo que põe termo às intenções desta obra.
O leitor se deparará com citações dos Santos Evangelhos que foram feitas na medida em que eram recordadas pelo autor não tendo, por conseguinte, o escopo da precisão quanto à fidelidade dos textos ficando para os interessados a seguinte bibliografia – que, por ser subtraída a seu verdadeiro contexto se tornando pretexto – tem caráter de alusão sem nenhum rigor científico e deve ser apontada com sinal “cf.”:
MATEUS, MARCOS, LUCAS E JOÃO, Evangelho de Jesus Cristo, Edições Quaisquer, sendo os originais escritos aproximadamente do ano 50 ao ano 100.



* * *



Da família dos Bravios nasce às vinte e sete horas do dia trinta e um de fevereiro de um ano em que a terra tinha já perdido a paz, o menino chamado Brutus Violêncio. De temperamento forte e cheio de manhas, desde muito cedo era especialista em encontrar e inventar motivos para dar golpes e dizer impropérios. Sua personalidade foi se firmando de forma tal que no povoado em que morava, o já emancipado município de Soco Recíproco não havia ninguém que se chamasse a si mesmo de valente, pois quem se atrevia tão logo era obrigado a conjugar na primeira pessoa do presente imediato o verbo adefuntar, um dos preferidos de seu áspero vocabulário.
Brutus desenvolvera ao longo de seus abruptos doze primeiros anos de vida o desejo incontido de que sua personalidade fosse coerente com a sua aparência, uma vez que estava persuadido de que era mais fácil conformar a sua personalidade à sua medonha figura e quase impossível fazer o contrário. O infeliz e mal nascido Brutus, fruto do ventre, digo, da prisão de ventre de sua progenitora a senhora Maria da Agressão e razão do colapso de seu pai o velho senhor Mansidão Quinada possuía um par de olhos – e desgraçadamente no tempo em que nasceu um par também tinha que ser constituído de dois – olhos vermelho-amarelados como se toda a insônia universal tivesse pesado sobre ele. Levemente corcunda, tinha a excêntrica mania de roer as unhas, e por isso não usava sapatos, mas uma horrível sandália de couro de lagartixa – das que ele mesmo costuma caçar – para facilitar o acesso aos por ele chamados “polegares dos pés” e proceder ao corte das unhas – encravadas desde a sua indesejada concepção.
Era detentor de poderosa audição – prerrogativa de quem tem um palmo de ouvido externo. E o intervalo entre uma orelha e outra, ou seja, a cabeça era consciente de que existia só para bem desempenhar o seu papel: separar uma e outra orelha! Sua testa saliente, acesso rápido e infalível à nuca formando com ela um só e mesmo átrio, não fazia que ele fosse de todo calvo, uma vez que suas narinas não deixavam subsistir tal hipótese. O artístico rastafári nasal o obrigava a ter que espirrar a todo o tempo posto que devido a sua miserável pobreza não tivesse condições de comprar xampus anticaspa.
Não obstante a leve desproporção quanto ao número dos dedos das mãos (sete na esquerda e três na direita), encorajava-se a si mesmo a não sentir-se tão prejudicado, pois que infelicidade isto poderia trazer a alguém cujo membro superior direito faz o respectivo cotovelo ser como que um terceiro calcanhar? E isso é tanto mais vantajoso na medida em que com o membro superior esquerdo, incapaz de tocar a cintura, mas munido de uma generosa mão de sete dedos, pode simultaneamente proceder à assepsia das narinas, das cavidades auriculares e brincar de motorzinho com a língua posta entre os lábios produzindo aquele som angustiante que as crianças produzem antes mesmo de aprenderem a dizer “gugu-dadá”.
Sua intimidante altura eufemismada em razão da sua corcunda bastante acentuada ainda assim não deixava de causar espanto. Associados à pronúncia de seu terrível e conhecido nome, os seus modestos dois metros e trinta e dois centímetros com sete milímetros, lhes garanto, conseguia impor respeito – ainda que imerecido. Desesperado procurava uma panacéia em dose única para minorar seus sofrimentos – é digno de menção que ele tinha todo tipo de doença e que usar um remédio pra cada uma delas já o tinha feito experimentar mui fortes tonteiras e só não foi ao chão impedido pelo equilíbrio proporcionado por seu pé esquerdo que ocupa sozinho uma área de setenta por quarenta e três centímetros.
Não vou usar aqui a expressão “um belo dia...” porque na vida desse desgraçado sujeito não se podia contar dias belos se é que tal dia contava com a exibição da estrambótica figura de Brutus Violêncio. Contudo, o fato é que um dia depois da aula – sim, ele estava já no sétimo ano que não cessava de repetir a terceira série do primário. Invejável constância! Saindo do colégio depois da quinta briga costumeira (quatro – uma a cada intervalo e a última na saída), pisa com seu “pezinho” esquerdo sobre um papel que traz em si umas considerações nas quais ele se deteve por muitos minutos e por alguns motivos sendo o principal deles a dificuldade de enxergar dada ao fato de reunir nos seus olhos todos os graus da miopia. Quantas vezes ele não quis ser cego só para ser dispensado do esforço que tinha de empreender para ler as minúsculas letras que via nos outdoors espalhados pelas ruas?!
Ficou profundamente interessado no que dizia o papel depois de ter desistido de lê-lo de cabeça para baixo. O papel trazia uma frase que o ensinava a oferecer a face direita ao agressor que tivesse desferido um golpe na sua face esquerda. De primeiro impacto ele pensou que a frase fosse de autoria do maior louco de todos os tempos, mas percebeu que a frase não continha todos os erros ortográficos possíveis e imagináveis e que, portanto não podia ser sua. Assim sendo podia até ser de autoria de um louco, mas não do maior de todos os tempos. Ele não parou por aí. Começou a filosofar e percebeu que aquela sentença vinha ao encontro dos seus desejos mais ocultos e corroborava admiravelmente a sua conduta pessoal desordenada. Agora ele já louvava usando todo o seu léxico de adjetivos (bom e legal), o grande filósofo autor desta maravilhosa frase. Surge a partir deste momento a linha mestra da vida de Brutus Violêncio. Ele empenha doravante toda a sua vida no árduo e apológico trabalho de descobrir as diversas respostas para a pergunta que agora se lhe impõe: “o que fazer depois de oferecer a outra face?
Para avançar proficuamente em sua investigação ele concebeu a idéia de procurar outras frases do mesmo autor desta que tanto lhe ocupava os pensamentos e encontrou um livro com frases e fatos vividos por esse mesmo autor. Não tinha nunca ouvido dizer de como proceder à leitura desse livro, e então, como mais lhe convinha devorou este livro que guardava algumas afirmações que pareciam até mesmo ser famosas. A vida de Brutus agora tem um sentido, pois ele busca formar a sua filosofia de vida em base dessas sentenças. Ele apesar de grande e valente, várias vezes enquanto brigava teve o rosto esbofeteado em virtude da dificuldade de mover-se com destreza, com efeito, seu corpo era grande à proporção das próprias dívidas.
Um fato curioso o intrigava. Sempre que fora esbofeteado graças a sua lerdeza, o bofetão sempre alvejava a face esquerda – se bem que ele sempre tenha se confundido bastante nesse negócio de direito e esquerdo. Mas o que importa é que ele, com mais este agravante tem agora motivos suficientes para praticar tudo o que puder se depreender das coisas que se conserva daquele autor. A princípio lhe pareceu – e disso o quiseram convencer – que o autor da frase pretendia formar quem a lesse ou ouvisse para que fosse tardo no irar-se e não fosse ávido de vingança. Mas o fato é que Brutus está evoluindo no seu modo de pensar e que já não mais aceita opiniões vazias ou desprovidas de sentido lógico ainda que opiniões deste tipo fossem mais acessíveis à sua rasa compreensão.
Prosseguindo ele sozinho no ato próprio da sua razão chega à conclusão de que a opinião de que tentaram convencê-lo está correta apenas quanto à primeira proposição. O autor parece ter querido sim formar os destinatários da frase para serem tardos no irar-se, pois o fato de mandar oferecer a outra face antes de qualquer outra reação manifesta o não desejo de que se seja precipitado na decisão de como reagir – uso e abuso da santa paciência. Entrementes, quanto à segunda proposição achou por bem controverter, pois não é verdade que o autor também queria incutir um espírito antivingança uma vez que depois de mandar oferecer a outra face não prescreve nada mais deixando livre o leitor para ulteriores interpretações oriundas do caráter reticencioso dessa mesma proposição.
Persuadido disso como estava pôs-se a procurar naquele livro que traz uma seleção de fatos desordenados cronologicamente – e que pra ele às vezes não fazia o menor sentido – quais seriam as hipóteses de como reagir depois de alvejada a outra face. E para sua felicidade tão logo encontrou uma que muito lhe apetecia: “E tu, vai e faze o mesmo”! Pronto! Encontrara aí ótimo conselho. Está agora definitivamente derrubada a proposição em favor do não vingar-se. O autor mesmo mandara revidar! Estava eufórico por ter encontrado tão rapidamente uma primeira hipótese. E parece não ter sido a primeira só para efeitos de possibilidade, mas também como primeira reação que pode necessariamente ou não preceder outras de maior ou menor intensidade e repercussão.
Agora – pergunta-se ele – depois de ir eu e fazer o mesmo devo parar por aí, ou será que este livro ainda me fará sugestões que agradem ao máximo o meu espírito sádico? E com toda a voracidade mergulha novamente naquele livro ansiando por ver ratificada a sua mania de violência. E encontra agora aquele filósofo dando lições de como fazer uma guerra e fica convencido de que só deve parar depois de “ir e fazer o mesmo” quando perceber em sã consciência a opulência do tamanho ou da força física do agressor considerando até se ele vem acompanhado ou não, e se vem, por quantos.
Quão maravilhoso é esse livro! Nem mesmo um pequeno curso por correspondência que Brutus tinha em sua posse intitulado “A Glória de ser Déspota aprenda passo a passo” de um autor chamado Severus Pulsat oferecia tantas possibilidades criativas e eficientes de vingar-se com classe. Muito lhe inspiravam aquelas sentenças que evocavam a hipótese de prosseguir com a vingança valendo-se do sequestro com tortura: “... ali haverá choro e ranger de dentes... dali não sairás enquanto não pagares o último centavo”! Brutus flutua na meditação e começa tão logo a adquirir armas de fogo de todos os calibres e gêneros para que pudesse pôr em prática o que lhe sugerisse sua insana imaginação, sua destrutiva criatividade.
Contudo, não cessando a leitura do livro – que em se tratado de violência é como um sol que não conhece ocaso - encontrou o filósofo afirmando com toda a veemência que não viera trazer paz ao mundo, mas a espada! Agora teve de se ocupar em vender todas aquelas armas de fogo e começar a adquirir foices, canivetes, punhais, navalhas, facas, machados, espadas e outros. E não podia ser diferente, pois também aquele filósofo dissera que o servo não é maior que o seu senhor, e se ele era adepto apenas do uso de armas brandas, Brutus também seria! E ele já se considerava amigo daquele filósofo que dizia que seus amigos eram os que seguiam seus preceitos. Brutus não teria dificuldades em obedecer aos preceitos daquele que lhe abrira os olhos para a realidade nua e crua, digo, cruenta deste mundo. Decidiu-se que obedeceria a ordem que dera a mãe dele numa festa de casamento – ele não queria tomar nenhuma providência e ela mandou que fizessem tudo o que ele dissesse. O filósofo já estava convencido de que nada poderia fazer, de tal sorte que o olhar de sua mãe com certeza foi ameaçador e medonho naquele intervalo entre o “... a minha hora ainda não chegou” e o “fazei tudo o que ele vos disser”!
Certamente – pensava Brutus – aquele mestre da violência aprendera da própria mãe a arte de intimidar como ela o intimidara naquela festa de casamento com apenas um olhar que lhe sugeria: “reage se não...” E isso ficava cada vez mais evidente quando via o mestre chamar adeptos para a sua violenta doutrina. Nada explicava de início, não sabia dizer ‘por favor’ e nem perguntar se o sujeito queria, mas apenas dizia com ares de quem não deixa outra opção: “Vem e segue-me”! A postura daquele mestre punha em fuga qualquer sujeito. Brutus estava impressionado com aquele episódio onde seus inimigos querem fazer-lhe mal o lançando ao precipício e ele simplesmente passa pelo meio deles e ninguém lhe põe a mão. Quem se atreveria? E se ele convocasse uma legião de anjos para defendê-lo como em outra oportunidade afirmou que era possível fazer? Como Brutus o invejava!
Agora Brutus começa a perceber que aquele filósofo ensinou aos seus primeiros seguidores a enganar o adversário fazendo-o pensar que está com vantagem pra que depois ele veja o que é bom. “Eis que vos envio como ovelhas no meio de lobos” Que inteligência espetacular e minuciosa! Este homem devia trabalhar em alguma espécie de serviço secreto! E mais, Brutus estava aprendendo com ele a ser humilde e covarde quando fosse conveniente para sobreviver por mais tempo e deleitar-se evoluindo na própria violência. Eis que agora Brutus lê e consegue imaginar o homem dizendo aos seus: “acerta as contas com teu adversário enquanto estás a caminho com ele para que não aconteça que ele te entregue ao juiz...” É... ser violento é justo e necessário, mas não dá pra ser idiota. Quando convém é bom não parecer valente, mas covarde! É lógico! Agora Brutus tem uma definição de violência: “É a arte de agredir oportuna e inoportunamente desde que a ocasião não impeça”! E o idiota seria aquele que agride oportuna e inoportunamente sem considerar a ocasião. Note-se o progresso na filosofia de Brutus! Faz contemplar ao contrário a frase da bandeira brasileira: há relativo progresso, mas o que ele terá feito com a ordem? Uma filosofia cinco estrelas – todas cadentes, diga-se de passagem.
Brutus ia anotando todas as conclusões filosóficas a que chegava e concluiu que tudo era muito bom! Principalmente quando leu que aquele filósofo ensinava a respeito de um ‘reino dos céus’ e o que se concluía de suas palavras é que esse reino era tudo de bom, era a mesma bondade! E devia mesmo ser bom com um ‘b’ bem grande – intuía Brutus – pois o homem havia dito que esse reino era conseguido à custa de violência e que só os violentos teriam acesso a ele. Um dia Brutus descobre que tudo o que é, é bom, uno, verdadeiro e belo e então assim devia ser esse ‘reino dos céus’. Mas depois vê aquele homem afirmando ser a verdade. Brutus já estava convencido de que a verdade não sabe mentir, mas agora ele tem que admitir que aquele filósofo o estava decepcionando. Como é que a verdade se poderia contradizer? Eis que Brutus entra numa crise violenta! Aquele que o fizera apaixonar-se por um ideal agora frustra todas as suas expectativas! Aquele homem não sabia ser uno! Sim, agora Brutus é capaz de perceber a incoerência nos atos daquele homem que faz secar uma figueira que não dera figos sabendo que não era tempo de figos. E mais, usou mal o seu poder, uma vez que da mesma forma poderia tê-la mandado produzir figos e pronto!
Aquela mente brilhante parecia agora estar ficando embaçada em virtude do desequilíbrio latente em todas as suas ações. Afinal, o que mais poderia querer um cego que está à margem do caminho senão poder enxergar? Não é tão óbvio? Pois aquele filósofo tivera a capacidade de perguntar a um cego desses: “O que queres que eu te faça”? Pobre Brutus Violêncio! E agora? Toda a sua filosofia estava ruindo! O que fazer? O que pensar? Que providências tomar? Sim, pois se aquele homem se contradiz quem vai ser capaz de acreditar nele e de fazê-lo acreditado? Brutus agora se recorda de ter lido que aquele homem dissera que o Pai é quem dá testemunho dele, mas lembra-se também de que ele se negou a mostrar o Pai a um tal Filipe que lhe pedira este obséquio.
Brutus está profundamente decepcionado! Perdera-se o sentido com que tentar fazer pleno aquele intervalo entre o seu esdrúxulo nascimento – sim, nascera sozinho em casa enquanto sua mãe esta na feira – e a sua morte desejada por tantos e tentada por ele mesmo tantas vezes, porém sem sucesso. Entrou num tal estado de nervos contra aquele filósofo – que agora para ele não passava de uma fraude – que precisava de algum calmante. Receitaram-lhe água com açúcar, mas ele não conseguiu ingerir por não conhecer a receita! Ele estava agora disposto a responder com toda a sua ira aquela pergunta que esse filósofo fizera a seus seguidores numa determinada região: “E vós, quem dizeis que eu sou?” Mas não respondeu por que de tal modo se ocupara de sua filosofia que relegara ao esquecimento todo o seu léxico de impropérios que agora era menor do que o de adjetivos. Então agora ele manifesta sua decepção com o filósofo somente suspirando enquanto diz: “É...”
Brutus começa a pensar que não vale a pena ser adepto de tal filósofo. Imagine que agora ele o está vendo ser agredido no rosto e não oferece ao outra face como ele mesmo ensinara! Porventura teriam começado pela face direita, e, uma vez invertida a ordem dos fatores a filosofia não funciona? Brutus não sabe, só sabe que além de tudo o filósofo ainda reage dizendo: “Se falei mal, mostra-me em que, mas se falei bem, por que me bates”? Não era esta a reação esperada de alguém que dizia ter vindo trazer fogo à terra! Brutus quer separar-se de tal filósofo! Que absurdo! Ele fala até de cruz e sofrimento! E que história foi aquela de chorar por um amigo? Que história é essa de “Vede como ele o amava”? Brutus estava mais interessado em “vede como ele o ‘amassava’ ou ‘amarrava’”! Aquele que ensinou que do coração é que provêm os assassínios, roubos, pensamentos impuros entre outras coisas más agora diz: “Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração”! Conversa fiada! Brutus não quer mais saber desse filósofo. Quer desvincular-se. Mas como?
Ah! O mesmo filósofo parecia ter dado a receita: “Quem não está comigo está contra mim”! É isso! Brutus não está mais com esse filósofo. Na verdade aquele “Sem mim nada podeis fazer” nunca o tinha convencido mesmo! Brutus estava convicto de que podia tudo sem alguém que diz trazer a espada ao mundo e depois manda um dos seus pôr a espada na bainha e não usá-la. Que homem é esse a quem o vento e o mar obedecem, mas que se deixa matar daquele jeito? Que raio de livro é esse que se contradiz sempre? Brutus chorou! Também não era pra menos. Aquele de quem se esperava toda a violência partira prometendo enviar um Defensor! A separação está agora definitivamente dada! E Brutus não pode conviver com tamanha desilusão! Agora perdeu-se todo o brilho daquele jargão que tanto o animava: “Violência gera violência”. O homem com quem pensou que aprenderia a ser violento em plenitude era um manso cordeiro!
Mais uma vez então Brutus se tenta matar rasgando-se da boca até ao calcanhar, mas devido à desigualdade de tamanho dos membros superiores fracassa ainda essa vez. Tivesse ele tentado perder a vida em vez de morrer, e já teria conseguido na primeira tentativa, pois nunca olhava bem onde deixava as suas coisas. Mas não desistiu. Depois de fracassar ainda umas quinze vezes com tentativas inúteis como: morrer de rir; morrer de raiva; morrer de vergonha; morrer de medo (com ele esta era a que menos funcionava) e morrer de frio (mas está tão gordo que há muito já não conseguia dormir dentro da geladeira) viu que um dos seguidores daquele filósofo também se decepcionou irremediavelmente com ele traindo-o e depois foi enforcar-se. Assim termina a trajetória filosófica de Brutus Violêncio que vendo o desatino deste seguidor agiu conforme mandara o segundo conselho que encontrara na pesquisa daquele livro desorganizado: “E tu, vai e faze o mesmo”!
Brutus encontrara naquele livro muitas possibilidades de como reagir depois de oferecer a outra face, mas conjugou o verbo adefuntar na primeira pessoa – agora do tempo infortúnio presente – antes de ler “perdoai setenta vezes sete”. Se antes tivesse já se deparado com esta sentença certamente teria se adefuntado há muito mais tempo. O município de Soco Recíproco anuncia o falecimento daquele que há tantos anos dinamizava a vida de seu povo. Que fazer agora sem os fortes gritos que dava pelas ruas? A quem recorrer em caso de eminente briga desfavorável para si mesmo? Que serão das festas e das aulas sem as brigas interessantes e engraçadas em que ele se envolvia? É... Brutus deixa saudades! Em sua homenagem escreveram um epitáfio: “Aqui jaz em paz o que queria a guerra, descansa o que cansou de descansar duro e frio como sempre foi, mas pacífico e manso como nunca seria se aqui não estivesse”!

Um comentário:

  1. Parabens!!
    texto muito interessante, principalmente porque retrata a realidade de nossos dias, onde nos custa muito oferecer a outra face(do amor). Seu texto é muito rico em conteúdo filosófico, mas não foge da teologia nem tão pouco das questões humanas.
    ótimo texto!!!

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